segunda-feira, 17 de julho de 2017

69ª sessão: dia 18 de Julho (Terça-Feira), às 21h30


“Eu fi-los ver, não fiz? Eu mudei tudo”, afirmou certo dia o "patrão" de Hollywood.

"O homem que fez tudo em primeiro lugar", sentenciou o historiador Kevin Brownlow.

David Wark Griffith (1875-1948) foi tudo isto e muito mais e qualquer agradecimento ou homenagem pecará sempre por defeito.

Poderíamos mostrar as curtas-metragens revolucionárias como A Corner in Wheat que já possuem todas as figuras de estilo, ambiências e choque com o real que os grandes cineastas posteriores desenvolveriam à sua maneira; o épico da Nascença de uma Nação ou o Intolerância que aglutina todas as épocas e todos os povos; poderiam ser os melodramas intimistas que de Broken Blossoms a True Heart Susie protegeram os solitários e os frágeis na terra levando-nos devagarinho às lágrimas, tão tão perto de Lilian Gish; ou Abraham Lincoln, já a experimentar e a levar longe o som, ou... ou...

Mas acabamos por escolher The Struggle, obra final antes da penúria de mais um pioneiro condenado ao esquecimento em vida, pois mostra sem precedentes todos os problemas da altura, os de hoje e com certeza os do futuro. Não através de queixinhas ou de diálogos denunciantes mas pelo poder da expressão do humano em união com as formas cinematográficas; pelo poder incomensurável da câmara de filmar.

O maior dos cineastas e o maior dos filmes. Foi o grande D. W. Griffith, mostrando-se mais do que aberto à transição do mudo para o sonoro, que escreveu em 1929 que "o cinema falado arruinou o mudo, oferece tantas coisas a mais que os espectadores já não podem ficar satisfeitos só com o cinema mudo. Se há quem não goste dos filmes falados, talvez isso dependa do facto de ainda não termos encontrado a solução para o diálogo. Se se continuar a imitar a técnica teatral, matar-se-á o cinema falado. É preciso encontrar uma solução para o diálogo e sei que isso se vai conseguir. Sei o que é preciso fazer, e acho que dentro de um ano conseguirei demonstrá-lo. Temos que continuar a usar a mesma técnica cinematográfica que conduziu ao cinema actual e acrescentar o diálogo. Se o conseguirmos fazer, teremos o maior espectáculo do mundo. Mas temos que manter a velocidade, a acção, o movimento, a vida, o ritmo do cinema moderno".

Jesús Cortés, escreveu no seu blog que "ver agora, quase 80 anos depois da sua estreia, esta obra suprema dos anos 30 é um cabo dos trabalhos considerável (nota: "cruce de cables" no original). Não só pela raiva e pelo assombro perante a cegueira dos seus contemporâneos (e a injustiça porque nem o tempo nem a crítica "moderna", talvez demasiado moderna, o restituíram ao seu verdadeiro lugar) mas sobretudo pela capacidade de um gigante para ir mais além quando as condições são as piores imagináveis. The struggle, para mim, é um dos passos em frente mais desconhecidos que o cinema sonoro deu e um dos filmes mais inquietantes da história do cinema. 

"Mais duro e profundo do que The crowd de Vidor, mil vezes mais intimidante do que The roaring twenties de Walsh, esta é a obra chave do "cinema da rua", tão despido e em bruto como só vários Rossellinis emblemáticos, muitos anos depois, alongando a sombra de The sorrows of Satan, uma das suas grandes obras-primas mudas."

Jacques Lourcelles, no Dictionnaire, escreveu que "é então o último filme de Griffith, de budget muito pequeno, sem vedetas, rodado num mês nas ruas e um estúdio do Bronx. A ternura do autor e o seu interesse pelos seres comuns presos pela corrente, muitas vezes amarga e dolorosa, da sua vida quotidiana, aparecem aqui mais claramente que nunca. O facto de que esta obra modesta em todos os seus aspectos encerre a carreira gigantesca do realizador de O Nascimento de Uma Nação e de Intolerância incita bastantes reflexões. À chegada do sonoro, Griffith não se integra no sistema hollywoodiano. Alguma vez esteve integrado? Este imenso cineasta que criou Hollywood e, indirectamente, o seu sistema nunca fez totalmente parte dele. Além disso, os seus pares, ou melhor, os seus discípulos (Walsh, por exemplo), porque Griffith não teve verdadeiramente igual na sua época, consideravam-no acima de tudo um solitário: a loner. O gigantismo de um certo número dos seus filmes deveu-se unicamente ao seu gosto pela História, à sua vontade de a restituir na sua amplitude e na sua verdade. Quando saiu da História, outra tendência, talvez a mais profunda, conduziu Griffith para episódios de dimensões estreitas, vividos por personagens humildes e caros ao seu coração: inocentes, seres vulneráveis que têm de deflagrar uma luta gigantesca, desproporcionada em relação aos seus meios, só para sobreviver e manter um equilíbrio frágil. Sem dúvida que o personagem de excepção que foi Griffith se reconheceu neles, se sentiu ligado secretamente a eles, à sua obstinação delicada, aos seus acessos de fraqueza e de desânimo, aos seus sonhos de felicidade infantis. São personagens desta espécie que Griffith aqui retrata, com uma ausência de sofisticação e de recuo tais que o filme suscitou a chacota do público e foi um desastre comercial"

Até Terça!

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