quinta-feira, 25 de maio de 2017

62ª sessão: dia 30 de Maio (Terça-Feira), às 21h30


Só agora prestamos homenagem a um actor, realizador e argumentista de Hollywood que tanto nos diz e tanto nos inspirou ao longo dos anos: Sylvester Stallone. Seja em Rocky e nas suas sequelas, nas ruas dessa Filadélfia que o tenta deitar abaixo a cada passo; em First Blood, escondido na floresta em que o barricam como uma presa até os fantasmas do Vietname se libertarem e declararem guerra à América inteira; nos filmes que foi fazendo com artesãos talentosos como John Flynn e produtores loucos como Menahem Golam ou ainda nesse belo Paradise Alley em que, como sempre, estava "tão próximo do inferno como do paraíso".

Juntando-se em 1997 a James Mangold, que teve pelo menos o carácter para mudar de opinião em relação ao Sly que se via na altura (e mesmo agora) só como uma vedeta sem grande talento de filmes de acção, a re-afirmação de Stallone como actor em Cop Land (a nossa próxima sessão) voltava-se a confundir com o percurso da sua personagem, elevando-se com o seu imenso talento e a sua imensa aura a uma tomada de posição por todos os desvalidos deste mundo, incentivo para os levantar do fundo do abismo da auto-comiseração, como uma mão que guia alguém, algures, para longe da grande sombra em que a vida às vezes se transforma, qual Chaplin dos tempos modernos.

Para nos apresentar o filme vamos ter o crítico e tradutor José Roberto Rocha, que volta para "one more fight" por Sylvester Stallone. O autor do blog Era Uma Vez na Paraíba preparou-nos um vídeo para acompanhar a sessão.

Foi o próprio Sylvester Stallone quem confessou em Londres, em 2014, que "com Cop Land, eu estava naquele ponto em que as críticas me começaram a incomodar outra vez, que era um paspalho – isto apesar do Rocky só ter seis minutos de fisicalidade e o resto serem só conversas. Eu basicamente investi o meu salário para financiar o filme porque queria provar o ponto de que não era só um paspalho. Queria trabalhar com actores mesmo bons, com todos aqueles actores maravilhosos. Serviu um propósito. Gostava que tivesse sido mais bem sucedido, mas foi mesmo algo que estou muito contente de ter feito porque me fez perceber o que é que queria fazer no futuro."

Mangold, quando lhe perguntaram se escreveu mesmo o guião de Cop Land em duas semanas, respondeu que "quero dizer, basicamente. Continuei a arranjá-lo durante o ano e meio seguinte. Houve uma espécie de consumo de cigarros em cadeia…até menos que 2 semanas. O que quer dizer que houve um período de 5-dias de não dormir, a viver só de cereais de pequeno-almoço e cigarros, e foi mesmo à volta de quando os interrogatórios da Comissão Mollen estavam na televisão. Estava em Nova Iorque, estavam a haver estes inquéritos de corrupção policial. Esta merda estava toda no ar. Tive esta ideia e comecei a escrever e estava confuso mas o que escrevi foi o filme, essencialmente, e depois o que aconteceu foi que — acho que tinha 147 páginas. E mandei-o para as pessoas que me representavam, e elas ficaram tipo, “Há aqui qualquer coisa de interessante, mas nunca o mostres a ninguém. Está uma confusão.” Portanto pu-lo de parte e, depois, quando estava a fazer Heavy mandámo-lo para o Lab, e eu pensei, bom, não sei, talvez eles me possam ajudar a perceber o que fazer desta coisa. Chegou ao Sundance Lab como um projecto de realizador e argumentista e depois ficou numa lista privilegiada para aqui — eu estava a viver na Costa Lesta na altura — e depois foi a loucura. E então o meu agente começou a fazer deslizar este guião às pessoas — o mesmo guião ilegível de 147 páginas — e depois transformou-se em loucura. Aí as pessoas estavam-me a oferecer 7 dígitos para comprar o guião de fora das minhas mãos, para o fazer com outro realizador. Era uma loucura. E eu disse-lhes não a todos porque o queria fazer eu, e as únicas pessoas dispostas a fazer esse acordo eram o Bob e o Harvey [Weinstein].

"(...) Teve toda uma história interessante. A primeira pessoa a quem o Harvey Weinstein o deu foi o Bob De Niro, que gostava mesmo do guião mas não queria trabalhar com um jovem realizador e ainda não me tinha encontrado. Devíamo-nos ter encontrado, mas não encontramos. E então fomos ao Sean Penn, houve um momento em que se falou ao John Travolta sobre o assunto, mas ou as pessoas não aderiam ou o Harvey não conseguia fazer um acordo. Consegui convencê-los a fazer uma proposta de um milhão de dólares a Gary Sinise, foi mesmo depois do Forrest Gump, e vim cá e encontrei-me com o Gary e ele disse-me que não queria fazer o filme porque o papel não era sexy que chegasse para ele, no momento em que ele estava na sua carreira. O que foi devastador para mim porque tinha trabalhado literalmente seis ou sete meses só para lhe arranjar uma proposta, e não achava que o papel fosse suposto ser sexy. Pensava que isso não era em absoluto o que era suposto ser. É suposto ele ser um oprimido de forma muito manifesta. ‘Sexy’ não é uma palavra que uso para os oprimidos a toda a hora. Estava devastado porque não achava que o filme fosse acontecer. Cheguei a casa e recebi uma chamada do agente do Sly, o nome dele era Arnold Rifkin, eu estava na mesma agência e ele estava à frente da agência, e ele disse, “O que é que achas do Stallone para este filme?” E eu fiquei tipo, “O que é que eu acho? Acho que não. Acho que não.” E ele diz, “Porquê?” E eu digo, “Tornou-se uma caricatura de si mesmo, não gosto de nenhum filme dele mas o primeiro Rocky…"

"(...) Eu sou fã do Rocky. Gosto do First Blood. Mas estava a exagerar com este tipo. Era do tipo, “Planeta Hollywood, esse bando todo, esse mundo todo,” e continuei com toda uma lista: “Ele controla os realizadores, assume o controlo dos filmes, diz-nos que lado da cara dele é que se pode filmar. Não vou lidar com isso.” E o agente diz, “Porque é que não lhe dizes isso tudo a ele?” E eu fiquei tipo, “Porquê?” “Porque ele vai voar agora mesmo para aí só para jantar contigo E vai voar hoje à noite para Nova Iorque e quer falar contigo.” E eu fiquei tipo, foda-se. Estava a ser manobrado, de certa forma. Sabia que se o Harvey soubesse que o Sly estava interessado, eu não ia ter grande manobra, a coisa ia simplesmente acontecer à minha volta. Ou estava dentro ou estava fora. Portanto falei com o Sly no Four Seasons em Nova Iorque no dia seguinte ao jantar. E ele é encantador. Eu disse o que tinha dito ao Arnold Rifkin, basicamente. Eu disse, “Eu não gosto mesmo de nenhum dos teus filmes tirando o primeiro Rocky,” e ele disse, “Até que concordo.” E eu disse, “Estou mesmo nervoso porque acho que não vais engordar. Acho que não vais interpretar o meu guião, acho que o vais mudar.” E ele diz, “Prometo que não, prometo que não.” Passei a pente fino a minha lista paranóica — o bando do Planeta Hollywood, e os casacos de couto. E ele disse, “Não vai acontecer, não vai acontecer, não vai acontecer.”

"E honestamente? Ele cumpriu. Nunca sugeriu uma mudança ao guião, nunca me disse como é que o devia filmar, nunca interferiu de todo na produção do filme apesar de ter muito mais experiência que eu a realizar filmes. Foi um anjo e só veio para o trabalho e partiu tudo. Mesmo quando fomos a Cannes com algumas bobinas avançadas do filme, aquela espécie de conclave de críticos da altura sentou-se connosco, era o Roger Ebert e a Janet Maslin e o Corliss e o Kenneth Turan. Perguntaram-lhe como é que foi trabalhar com este realizador estreante e ele atira, “Bom, ele deu-me tipo uma lista de 14 coisas que tinha que fazer,” e listou-as a todas, tipo, “Nada de Planeta Hollywood, não posso mudar o guião, tenho que ganhar vinte quilos…” E eu fiquei mesmo comovido porque ele lembrou-se mesmo de tudo, claramente, e comprometeu-se. Portanto sou um fã, sim."

Até Terça-Feira!

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