domingo, 14 de dezembro de 2025

427ª sessão: dia 17 de Dezembro (Quarta-Feira), às 14h30


Curtinhas para Todos, esta quarta-feira no Lucky Star – Cineclube de Braga

Durante o mês de dezembro, o Lucky Star – Cineclube de Braga apresenta o habitual ciclo de Natal. Neste mês foram já exibidos dois clássicos, cujas narrativas se relacionavam com a época natalícia, encerrando-se este ciclo com uma sessão especial para os mais novos, composta por curtas-metragens de animação. As sessões regulares ocorrem às terças-feiras na Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva, às 21h30. A sessão “Curtinhas para Todos” acontece no dia 17 de dezembro, às 14h30, também na Bibli-oteca Lúcio Craveiro da Silva.

Na próxima quarta-feira, 17 de dezembro, às 14h30, o cinema é para os mais novos. Encerramos o ano com uma seleção internacional de curtas-metragens de animação, pensada especialmente para as crianças, mas igualmente encantadora para todos os públicos. Esta sessão reúne diferentes narrativas a par de diferentes técnicas e estilos na animação, oferecendo um mosaico de pequenas histórias que falam de aventura, coragem e descoberta. Este conjunto de filmes de animação “Curtinhas para Todos” é distri-buído pela Agência de Curtas, no âmbito do programa “O Dia Mais Curto”, e cuja sessão em Braga conta, ainda, com a parceria e apoio da Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva.

A sessão é composta por cinco filmes: “Once Upon a Time in Dragonville” (2024), de Marika Herz, uma fábula colorida sobre amizade; seguida por “Sparrows” (2024), de Rémi Durin, uma história to-cante que explora o cuidado através do olhar das pequenas aves. A terceira curtinha é “Le Tunnel de la Nuit (2024), de Annechien Strouven, uma viagem poética que transforma o desconhecido num territó-rio de maravilha e curiosidade. Depois é a vez de “Forever” (2024), uma reflexão visual sobre tempo e mudança, contada com humor, realizada por Theo Djekou, Pierre Ferrari, Cyrine Jouini, Pauline Phi-lippart e Anissa Terrier. Por fim, a sessão termina com o filme de animação em 3D “Homework” (2024), de Nacho Arjona, um retrato divertido dos desafios e imprevistos que fazem parte do quotidia-no infantil.
 
Finda esta sessão, o Lucky Star – Cineclube de Braga retorna com nova programação no dia 6 de janeiro de 2026.

As sessões regulares do Lucky Star ocorrem no auditório da Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva às terças-feiras às 21h30. A entrada custa um euro para estudantes, dois euros para utentes da biblioteca e três euros para o público em geral. Os sócios do cineclube têm entrada livre. A sessão “Curtinhas para Todos” é gratuita.

Até quarta-feira!


quinta-feira, 11 de dezembro de 2025

An Affair to Remember (1957) de Leo McCarey



Por Laura Mendes 
 
An Affair to Remember não é apenas sobre amor cupidíneo, fortuito e inconveniente, que nos arranca de uma vida aparentemente estável e harmoniosa para um mar de aflições e percalços. O melodrama é tratado num quadro de inúmeras ramificações, levantando e apontando questões importantes, não só para a época em que o filme estreou, como também para a nossa – convocando a sua intemporalidade.
 
Um destes aspetos, genialmente trabalhado, – não fosse Leo McCarey o realizador de Duck Soup – é o humor: observamo-lo associado ao sentimento amoroso, diluindo as fronteiras entre o cómico e o trágico. As tiradas, expressões e atitudes de Nickie Ferrante e Terry McKay, especialmente no contexto público e munidas de caráter cómico, vão desenhando os seus perfis simultaneamente frontais e inibidos, já que se trata de camadas de máscaras repetidamente sobrepostas com o fim de proteger as suas personas sociais, manipulando o que dão a ver aos outros. Porque, sendo ambos membros de uma elite privilegiada, por todos reconhecíveis, a guerra interna travada em torno das aparências é acompanhada de uma outra contra os tablóides – o que nos leva a pensar este outro elemento, absolutamente central, no filme.
 
O seu início não permite enganos: vários jornalistas internacionais abordam, com alarido, o recém-anunciado casamento entre Ferrante e Lois Clark, herdeira milionária. Já no barco, os olhos alheios surgem perseguidores e exigentes, nos jantares e nos passeios noturnos, condicionando uma relação proibida, mas florescente, enquanto provam o impacte do burburinho social e do voyeurismo – sempre explorando a comicidade que daí advém –, ao mesmo tempo criticando a fachada social.
 
A escolha do barco como cenário propulsionador dos (des)encontros entre os dois amantes não surge despropositada. Rodeados de mar, o afunilamento da relação é adensado pelo seu isolamento, concentrando toda a tensão entre o íntimo e o público, o encoberto e o evidente. É de notar a beleza da cena do primeiro beijo, onde apenas vemos um enlace de braços e pernas nas escadas, as caras permanecendo envoltas em anonimato. O momento em que os dois saem do barco numa jornada por Villefranche é decisivo. Terry penetra na intimidade de Nickie, ambos mergulhados num mundo privado e familiar, rural, regido por Janou, avó deste último, figura que representa a intuição, a sensibilidade e a beleza. Mantendo o seu estatuto simbólico ao longo de todo o filme, aliás com repercussões para o seu desenlace, é ela quem permite a abertura à honestidade e à confissão, num lugar onírico, afastado da vivência social e das suas restrições. É de observar o contraste entre este cenário calmo e reconfortante e a borbulhante e impassível cidade porvir, repleta de manipulações e disfarces, mas onde Terry e Nickie, em permanente conflito com a sua interioridade, tentam procurar o que de verdadeiro existe entre todo o tumulto urbano.
 
Não abdicando de um lado kitsch, tal como notou João Bénard da Costa[1], ainda assim resiste como uma desconstrução da superficialidade da classe alta, denunciando a fragilidade inerente às artimanhas do fingimento, ao mesmo tempo que revela a imprevisibilidade e força do sentimento humano, ao qual é impossível escapar. 
 
[1] https://www.cinemateca.pt/CinematecaSite/media/Documentos/2021-05-06_AN-AFFAIR-TO-REMEMBER.pdf
 
 
 
 

domingo, 7 de dezembro de 2025

426ª sessão: dia 9 de Dezembro (Terça-Feira), às 21h30


An Affair to Remember de Leo McCarey, esta terça no Lucky Star – Cineclube de Braga

 
Durante o mês de dezembro, o Lucky Star – Cineclube de Braga apresenta o habitual ciclo de Natal. Neste mês serão exibidos dois clássicos, cujas narrativas decorrem na época natalícia, e uma sessão especial para os mais novos, composta por curtas-metragens de animação. Como é habitual, as sessões regulares ocorrem às terças-feiras na Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva, às 21h30.
 
A sessão “Curtinhas para Todos” acontece no dia 17 de dezembro, às 14h30, também na Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva.

Na terça-feira é exibido An Affair to Remember (1957), realizado por Leo McCarey, remake a cores de Love Affair (1939), do mesmo cineasta. Durante uma viagem de cruzeiro, Nickie Ferrante, um playboy sedutor, e Terry McKay, uma cantora independente, conhecem-se e apaixonam-se. Apesar de ambos estarem comprometidos, prometem reencontrar-se seis meses depois, no topo do Empire State Building, para confirmar se o amor resiste ao tempo. Mas o destino interfere, um trágico acidente impede o encontro e o futuro dos amantes toma um rumo incerto. Com Cary Grant e Deborah Kerr, McCarey assina um dos romances mais intemporais do cinema norte-americano.

O filme foi nomeado para quatro Óscares: Melhor cinematografia, Melhor Guarda-Roupa, Melhor Banda Sonora e Melhor Canção Original. Apesar de não ter vencido, tornou-se um clássico absoluto. Revalorizado ao longo das décadas e tido como um dos filmes mais românticos de sempre, ficou imortalizado na cultura popular, como em Sleepless in Seattle ou Sintonia de Amor, de 1993.

Leo McCarey (1898 - 1969) alternou entre drama e comédia ao longo da sua carreira. Começou nos estúdios de Hal Roach, onde trabalhou com Laurel & Hardy, e ganhou dois Óscares de Melhor Realização por The Awful Truth (1937) e por Going My Way (1944).
 
Destacam-se ainda os filmes: Love Affair” (1939), Duck Soup (1933) e Ruggles of Red Gap (1935), Good Sam (1948) e My Son John (1952). O seu trabalho influenciou várias gerações de realizadores pela forma como articulava elementos cómicos e dramáticos na estrutura narrativa, evitando a separação rígida dos géneros.

As sessões do Lucky Star ocorrem no auditório da Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva às terças-feiras às 21h30. A entrada custa um euro para estudantes, dois euros para utentes da biblioteca e três euros para o público em geral. Os sócios do cineclube têm entrada livre. A sessão “Curtinhas para Todos” é gratuita.

Até terça!


quinta-feira, 4 de dezembro de 2025

A Christmas Carol (1938) de Edwin L. Marin



por Jessica Sérgio Ferreiro 
 
Durante o mês de dezembro, o Lucky Star – Cineclube de Braga apresenta o habitual ciclo de Natal. Neste mês serão exibidos dois clássicos, cujas narrativas decorrem na época natalícia, e uma sessão especial para os mais novos, composta por curtas-metragens de animação. O ciclo abre com um dos filmes natalícios mais emblemáticos de Hollywood, A Christmas Carol (1938), de Edwin L. Marin, que ocupa um lugar especial no cinema de Natal. Na próxima sessão será a vez de An Affair to Remember (1957), de Leo McCarey, um dos romances mais influentes da história cinematográfica norte-americana, realizado por Leo McCarey e protagonizado por Cary Grant e Deborah Kerr. An Affair to Remember é uma obra de elegância intemporal, onde o amor, o azar e o destino se cruzam num melodrama que marcou profundamente a cultura popular. 
 
A Christmas Carol (1938) é uma das adaptações mais marcantes do célebre conto de Charles Dickens, que permanece, desde 1938, como uma das versões canónicas da história de Ebenezer Scrooge. Este filme sucedeu a várias versões anteriores, incluindo a primeira adaptação cinematográfica muda Scrooge, or, Marley’s Ghost (1901), de Walter R. Booth, igualmente fundamental e pioneiro, que inaugurou a presença deste conto no grande ecrã. Não obstante, a versão de 1938 é essencial para compreender como o conto de Natal se consolidou como tradição audiovisual.
 
O filme centra-se em Ebenezer Scrooge, um homem avarento e solitário que despreza o espírito de Natal. Na véspera, é visitado pelos fantasmas do Passado, do Presente e do Futuro, que o conduzem por uma metanoia completa. Produzido pela Metro-Goldwyn-Mayer, o filme tornou-se um clássico de Natal incontornável, firmando no cinema a figura de Scrooge como arquétipo. Substituindo inicialmente Lionel Barrymore, que ficou impossibilitado de representar o papel por motivos de saúde, Reginald Owen interpreta um Scrooge simultaneamente austero e vulnerável, cuja transformação interior se torna o centro emocional do filme. A atmosfera natalícia, recriada com detalhes de época, envolve o espectador numa Londres vitoriana caracterizada pela pobreza, mas onde o cunho moral da narrativa apela à solidariedade e à esperança.
 
A chegada do Fantasma de Jacob Marley é um dos momentos mais fortes do filme. A aparição de Marley, envolta numa atmosfera fantasmagórica prepara o tom moralista da narrativa. Outrora sócio de Ebenezer Scrooge, o Fantasma de Jacob Marley, regressa do além para alertar o velho forreta. Preso a correntes que materializam a culpa e a vida dedicada apenas ao lucro, Marley surge como figura inquieta e penitente, cuja visita serve de aviso: se nada mudar, Scrooge acabará condenado ao mesmo destino. É Marley, ainda, quem anuncia a chegada dos Fantasmas do Passado, do Presente e do Futuro, que irão guiar o protagonista até à redenção. Destaca-se, ainda, a cena com o Sr. Fezziwig, patrão respeitador dos seus trabalhadores, generoso e alegre, este episódio funciona como contraponto ao mundo frio, avarento e solitário de Scrooge.
 
O desenlace da trama culmina na manhã de Natal em que a transformação de Scrooge se conclui numa sequência cheia de energia, onde o personagem abandona o peso da amargura e se “reconcilia com o Mundo”. A cena em que compra o peru para a família Cratchit é emblemática e representa a generosidade e a partilha, inspiradas pelo espírito natalício. Por fim, o filme encerra com a prece compassiva: “Deus nos abençoe a todos”, exclamada por Tiny Tim, para rematar o corolário da história: a importância do cuidado e da bondade num mundo marcado por desigualdades sociais. 
 
 
 

domingo, 30 de novembro de 2025

425ª sessão: dia 2 de Dezembro (Terça-Feira), às 21h30


O Natal começa já na próxima terça com o cinema clássico no Lucky Star – Cineclube de Braga

Durante o mês de dezembro, o Lucky Star – Cineclube de Braga apresenta o habitual ciclo de Natal. Neste mês serão exibidos dois clássicos, cujas narrativas decorrem na época natalícia, e uma sessão especial para os mais novos, composta por curtas-metragens de animação. Como é habitual, as sessões regulares ocorrem às terças-feiras na Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva, às 21h30. A sessão para os mais pequenos acontece no dia 17 de dezembro, às 14h30, também na Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva.

Hoje, 2 de dezembro, o ciclo de dezembro começa com o clássico “A Christmas Carol,” (1938), realizado por Edwin L. Marin, uma das adaptações mais marcantes do célebre conto de Charles Dickens que ocupa um lugar especial na história do cinema. Este filme sucede a várias versões anteriores, incluindo a primeira adaptação cinematográfica muda “Scrooge, or, Marley’s Ghost” (1901), de Walter R. Booth, filme igualmente fundamental e pioneiro que inaugurou a presença deste conto no grande ecrã. Não obstante, a versão de 1938 é essencial para compreender como o conto de Natal se consolidou como tradição audiovisual. 

O filme centra-se em Ebenezer Scrooge, um homem avarento e solitário que despreza o espírito de Natal. Na véspera, é visitado pelos fantasmas do Passado, do Presente e do Futuro, que o conduzem a um caminho de reflexão e mudança. Produzido pela Metro-Goldwyn-Mayer, o filme tornou-se um clássico incontornável desta época festiva, firmando no cinema a figura de Scrooge como arquétipo.

A interpretação de Reginald Owen como Scrooge confere ao personagem uma transformação profunda e convincente: da avareza gelada à descoberta da compaixão e da alegria, guiado pelas visitas dos Fantasmas do Passado, Presente e Futuro. A atmosfera natalícia, recriada com detalhes de época, envolve o espectador numa Londres vitoriana onde pobreza, solidariedade e esperança entram em confronto directo.  Embora a obra tenha conhecido inúmeras adaptações ao longo das décadas, a versão de Marin destaca-se pelo equilíbrio entre dramatização e fantasia, captando o espírito moral e humano presente no texto de Dickens. 

As sessões do Lucky Star ocorrem no auditório da Biblioteca Lúcio Craveiro da Silva às terças-feiras às 21h30. A entrada custa um euro para estudantes, dois euros para utentes da biblioteca e três euros para o público em geral. Os sócios do cineclube têm entrada livre.
 
Até terça-feira! 



quinta-feira, 27 de novembro de 2025

NO OTHER LAND (2024) de Basel Adra, Rachel Szor, Yuval Abraham e Hamdan Ballal



Por Laura Mendes
 
O último filme que compõe o ciclo “Palestina Livre: O Cinema como Resistência” traz-nos um dos mais recentes registos da invasão, ocupação e anulação de um sem-número de vidas palestinianas. Estreado em 2024, realizado por um conjunto de ativistas pró-Palestina – entre eles, dois israelitas, Yuval Abraham e Rachel Szor –, No Other Land reclama o direito à imagem e à sua divulgação, no seio de um conflito armado.
 
De caráter brutalmente documental, inunda-nos, desde logo, de sinais de perigo: Basel Adra chega-nos com luzes e mensagens em pano de fundo, a tensão do acontecimento porvir está sempre presente e o jornalismo é, aqui, inseparável do ativismo, já que a tentativa de ocultação e humilhação impele a uma cada vez maior luta do jornalista pela verdade. Porque este é um jornalismo de mão, e o telemóvel, mediador por excelência, deixa de ser um objeto banal, onde o consumo de notícias é privilegiado, e passa a ter um papel fulcral na produção e documentação do real.
 
A problemática central de No Other Land é o registo imagético, a forma como a imagem não trabalhada, o retrato visceral, são ocultados, fortemente censurados, e como o combate dos filhos do ativismo contra a falsa autoridade faz uso da câmara para a denúncia e divulgação de práticas desumanas. Sendo este um conflito que atravessa anos e décadas, temos acesso a alguns dos registos feitos pelos pais de Basel – também eles ativistas –realçando o caráter geracional da luta travada através da tecnologia, da consciencialização, da atitude pública.
 
Uma luta de comunidade, que une pessoas – e vemos a centralidade do ato da manifestação conjunta – cuja dinâmica de entreajuda consegue (na maioria das vezes) ultrapassar as dissidências culturais e políticas: a certa altura, Yuval, israelita e co-realizador do filme, é confrontado com os atos cometidos por parte do seu país, sendo a conversa rapidamente interrompida pela necessidade de trabalhar na reconstrução de algumas casas – um momento que nos revela como o espaço para o diálogo, para o debate e formulação de problemas e soluções é posto em causa, e muitas vezes travado, por necessidades básicas, tal como o é um lugar onde viver.
 
A união dentro desta população é incontornável, fruto da brutalidade injusta que sofrem juntos, vendo nós na violência filmada, mais do que a homenagem ao próximo, ao amigo resistente, a insurreição contra o apagamento destes atos destrutivos. Tratando-se de um combate corpo a corpo, a câmara adquire uma materialidade confrontacional – como arma, denuncia e questiona práticas abusivas mas, à semelhança do que acontece com quem a segura, é também vítima da força impiedosa – palavra contra palavra, imagem contra imagem, o panorama abre-se e torna-se esta uma história de poder.
 
Assistimos ao desabar de Masafer Yatta sob a proteção de leis enviesadas, em nome da substituição fria e cruel da vida pelo armamento – em causa, o conjunto de declarações que afirmam que esta é uma terra israelita, exclusiva para treino militar, tendo como consequência a expropriação e expulsão de palestinianos aí residentes. Escolas e habitações destruídas, poços tapados, vários mortos e feridos às mãos do governo israelita personificado nos militares e, principalmente, em Ilan, essa figura cínica e impenetrável, conhecida da população que tantas vezes tentou o apelo à paz, à humanidade.
 
A contínua missão pela visibilidade mediática é dolorosa, incoerente e, por vezes, paralisadora, mas exige de quem é por ela responsável uma ação paciente e reivindicadora. Apesar de tudo, é o desespero que tende a vencer – observamo-lo na mãe de Harun Abu Aram (alvejado e deixado incapacitado pelos colonos, tendo posteriormente falecido), ao ver jornalistas entrar e sair da gruta feita sua casa, ambicionando partilhar a história do seu filho, no entanto sem que nada mude. Quando a família assiste ao que diz a televisão sobre a sua própria situação, temos o expoente da impotência, uma meta-reflexão que, dirigindo-se a nós, perpassa questões tal como a imunidade mediática, a insensibilidade a que somos sujeitos face às assoberbantes notícias que consumimos todos os dias, e de que maneira esta nossa condição paradoxalmente ausente e passiva tem repercussões irremediáveis para as pessoas que vivem em estado permanente de perigo e angústia.
 
A dimensão política externa aqui representada assenta na fé na comunidade internacional, na esperança de que os retratos íntimos do que se passa na Palestina cheguem até nós, estimulem uma reação naqueles que podem lutar por quem mais precisa. Revela-se, inclusive, a influência exercida por nomes poderosos e estruturais, com a menção à visita de Tony Blair, ex-primeiro ministro britânico (note-se o papel deste país no conflito), cuja presença impediu a demolição de uma escola, anos depois destruída – asseverando a simultânea fragilidade destas ações políticas às quais, na verdade, apenas subjazem interesses e manobras camuflados por valores humanos e democráticos.
 
Ainda que uma obra aclamada – galardoada com vários prémios internacionais de cinema, inclusive o Óscar de Melhor Documentário –, não se revelou um escudo contra as forças hostis; pelo contrário, não só foi Basel Adra alvo de várias rusgas a sua casa –atos repetidamente perpetrados durante os quatro anos de gravação do documentário, e após o lançamento do mesmo –, como também um dos elementos da equipa do filme, Awdah Hathaleen, foi morto, provando a perpetuidade deste ciclo de violência, desrespeito e perseguição, ao mesmo tempo que uma massiva incapacidade de travá-lo. No Other Land mostra-nos, acima de tudo, de que modo o cinema deixa de ser o espaço que nos envolve, e fabulando territórios nos quais acreditamos, transformando-se, ao invés, no intermediário do real – atentando-nos para ele – que, de tão afastado e manipulado, passa por imaginário.