«The Right Stuff (Os Eleitos), a adaptação de Philip Kaufman do aclamado retrato de Tom Wolfe sobre os astronautas originais da NASA, é "O" épico americano da última grande fronteira e uma aproximação genuinamente romântica da primeira geração de cowboys do espaço.»
Assim escreveu Sean Axmaker sobre o filme da nossa próxima sessão. Investimento pessoal do realizador que deu o litro e inclusive se zangou com muita gente para levar a sua avante, muito falado e visto na altura, detentor de um elenco portentoso e surpreendente, caiu nos últimos anos num relativo esquecimento, apesar de muitos cineastas da vaga americana dos anos 90 o terem em grande estima.
E assim propomos uma redescoberta pelas pulsões e visões aventureiras dos homens que nunca se contentaram com o adquirido. Como nos westerns, precisamente. O fascínio do desconhecido e do passo para o abismo como gesto inaugural.
Kaufman disse em entrevista a Richard Rushfield que "o filme inteiro não é sobre alguém em específico. É mesmo sobre qualquer coisa chamada o estofo certo. O estofo certo é o herói do filme. É uma qualidade que transmigra de alguma forma de uns para os outros. Quero dizer, no nosso filme e no livro do Tom Wolfe, parece que começa com Chuck Yeager, mas podia-se certamente traçá-lo mais para trás, fosse a Teddy Roosevelt ou ao Oeste Americano ou a Ernest Hemingway, que deu parte da definição que Tom Wolfe usou – graça sob pressão – como uma das qualidades do estofo certo. Portanto nos anos 60, nós não estávamos muito cientes de como essa qualidade se ligava ao passado Americano, à identidade Americana. Foi um momento extraordinário no tempo, mas foi no meio da corrida espacial. É daí que vem a espécie de Campeonato Mundial. Somos nós contra os Russos, e foi essa ânsia em ganhar que pôs as pessoas excitadas. E claro, foi maravilhoso quando John Glenn entrou finalmente em órbita, e como aponta Tom Wolfe, essa foi provavelmente a última altura em que todos os Americanos conseguiram concordar em alguma coisa, em que aplaudiram todos da mesma maneira."
Para os Cahiers du Cinéma e pela altura da estreia do filme, Charles Tesson escreveu que "quando Kubrick estava a realizar 2001, a NASA e o seu programa Apolo estavam a poucos meses de caminhar na lua. Pura coincidência? Que há em comum entre uma ficção que foi composta num estúdio e a verdadeira viagem para o espaço sideral, entre uma imagem de vídeo borrada em que se vê uma figura que mal se mexe e as cores de Cinema Scope em 70mm? Em relação a The Right Stuff, podíamos dizer que funciona como a síntese destas imagens, 15 anos mais tarde. (...) The Right Stuff é um documentário reconstituído mas é principalmente um filme de ficção científica no seu estado mais puro (uma ficção sobre a ciência) que, independentemente do seu guião é capaz de representar uma sombra do real. (...) André Bazin, que foi sempre atraído por um cinema de exploração, reconheceu que este tipo de documentário levantava um duplo problema: uma questão técnica e a da moralidade. “Fazer batota para melhor poder enganar o espectador a ver a realidade dos acontecimentos,” costumava dizer ele. E ao ver The Right Stuff, podíamos dizer que se encaixa perfeitamente neste modelo."
No seu Dictionnaire du Cinéma, Jacques Lourcelles escreve que "o filme exprime dois pontos de vista em simultâneo sobre o seu tema: nostalgia e exaltação (moderada) na descrição da era dos grandes pioneiros solitários, a maior parte das vezes ignorados pelo grande público; ironia e espírito crítico na descrição da era contemporânea. Antigamente, o piloto era o único soberano a bordo, antes e durante a operação. De seguida, devido à complexidade do material empregado, ele mal tinha direito a uma palavra sobre os preparativos e não tinha praticamente liberdade nenhuma, iniciativa nenhuma durante o próprio vôo. As missões espaciais, no que diz respeito à passividade forçada daqueles que as realizam, começam a parecer missões-suicidas. Esta dualidade de pontos de vista faz a riqueza do filme sem afectar a sua unidade. Ela afastou em certa medida o grande público do filme, atraído cada vez mais por obras monolíticas e desprovidas de qualquer subtileza. E The Right Stuff, que merecia um triunfo mundial, não teve bem o sucesso esperado. A mise en scène de Kaufman, clássica, comedida, luminosa, serena, evita a ostentação e a vaguidão. Quer-se herdeira dos grandes clássicos americanos, particularmente de Hawks, mantendo ao mesmo tempo o que há de mais precioso - o sentido crítico, uma certa irrisão discreta - na obra de um Robert Altman, por exemplo. Sob o plano da interpretação, o filme é particularmente brilhante. Kaufman reuniu no seu elenco alguns dos melhores talentos do cinema americano actual. À frente deles, uma composição admirável de Sam Shepard, uma espécie de Gary Cooper moderno. Se é permitido mostrar-mo-nos reservados em relação aos escritos (teatro e argumentos) de Sam Shepard, o seu talento como actor é inquestionável e espera-se que se possa desenvolver harmoniosamente nos anos vindouros. Lembremos que Sam Shepard entrou até agora noutros dois excelentes filmes: Frances (Graeme Clifford, 1982), uma biografia muito bem conseguida da actriz Frances Farmer, sobretudo na parte que trata dos seus problemas psicológicos e dos seus conflitos com a classe médica, e Country (Richard Pearce, 1984), uma evocação quase documental das dificuldades dos agricultores americanos de hoje."
Até Terça!
No seu Dictionnaire du Cinéma, Jacques Lourcelles escreve que "o filme exprime dois pontos de vista em simultâneo sobre o seu tema: nostalgia e exaltação (moderada) na descrição da era dos grandes pioneiros solitários, a maior parte das vezes ignorados pelo grande público; ironia e espírito crítico na descrição da era contemporânea. Antigamente, o piloto era o único soberano a bordo, antes e durante a operação. De seguida, devido à complexidade do material empregado, ele mal tinha direito a uma palavra sobre os preparativos e não tinha praticamente liberdade nenhuma, iniciativa nenhuma durante o próprio vôo. As missões espaciais, no que diz respeito à passividade forçada daqueles que as realizam, começam a parecer missões-suicidas. Esta dualidade de pontos de vista faz a riqueza do filme sem afectar a sua unidade. Ela afastou em certa medida o grande público do filme, atraído cada vez mais por obras monolíticas e desprovidas de qualquer subtileza. E The Right Stuff, que merecia um triunfo mundial, não teve bem o sucesso esperado. A mise en scène de Kaufman, clássica, comedida, luminosa, serena, evita a ostentação e a vaguidão. Quer-se herdeira dos grandes clássicos americanos, particularmente de Hawks, mantendo ao mesmo tempo o que há de mais precioso - o sentido crítico, uma certa irrisão discreta - na obra de um Robert Altman, por exemplo. Sob o plano da interpretação, o filme é particularmente brilhante. Kaufman reuniu no seu elenco alguns dos melhores talentos do cinema americano actual. À frente deles, uma composição admirável de Sam Shepard, uma espécie de Gary Cooper moderno. Se é permitido mostrar-mo-nos reservados em relação aos escritos (teatro e argumentos) de Sam Shepard, o seu talento como actor é inquestionável e espera-se que se possa desenvolver harmoniosamente nos anos vindouros. Lembremos que Sam Shepard entrou até agora noutros dois excelentes filmes: Frances (Graeme Clifford, 1982), uma biografia muito bem conseguida da actriz Frances Farmer, sobretudo na parte que trata dos seus problemas psicológicos e dos seus conflitos com a classe médica, e Country (Richard Pearce, 1984), uma evocação quase documental das dificuldades dos agricultores americanos de hoje."
Até Terça!