quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020

162ª sessão: dia 6 de Fevereiro (Quinta-Feira), às 21h30


Enquanto avançamos no nosso ciclo Manuel Mozos, já na quarta e penúltima parte da retrospectiva, chegamos a duas raríssimas curtas de 2001 e 2010. A nossa próxima sessão, com Erupção e Angelitos Negros, será portanto uma oportunidade única. A não perder.

No catálogo da segunda mostra do documentário português, Panorama, o realizador  deixa umas palavras sobre a sua ideia de cinema, dizendo que "existem diversas condicionantes práticas e muito concretas que delimitam e condicionam o uso das ferramentas e dos instrumentos do cinema. A experiência é uma delas, embora ache que nada impede alguém sem grande experiência de fazer um filme. Mas conhecer a História do Cinema, conhecer os meios técnicos com que se trabalha (quer se trate de suportes digitais ou película, material de som), ter noções de montagem, saber o que é um plano, e o que é um plano colado com outro, o que é que isso proporciona, são tudo conhecimentos que funcionam eventualmente como mais-valias. A relação humana tem também a sua importância: em cinema nunca se trabalha sozinho, trabalha-se em equipas, mais pequenas, maiores, e tem que haver uma relação honesta e concertada com as pessoas que estão envolvidas no que se pretende filmar, e que posteriormente resultará num filme. A relação com o produtor, por exemplo, pode imediatamente fechar um bocadinho aquilo que o realizador idealizou, porque é nesta relação que se evidenciam as questões que têm a ver com meios de produção, onde se decide o nível de disponibilidade para a persistência, para ir mais fundo num determinado assunto. Mesmo o momento e o modo da difusão e exibição podem condicionar o trabalho de fazer um filme. Rapidamente o realizador se vai apercebendo que existe uma série de condicionantes que limitam aquilo que inicialmente pretendia fazer. Mas claro que também pode surgir o contrário, que é ter momentos mágicos em que aparece uma coisa inesperada e que realmente dá outra força ao filme.

"Tudo isto se convoca e altera no momento em que se filma, e está dependente daquilo que cada um escolhe como assunto a tratar (em documentário ou ficção). Se se pretende filmar um determinado acontecimento ou um episódio, ou se se quer ir filmar uma fachada de um prédio e o passar do tempo sobre essa fachada, a linguagem cinematográfica é convocada de maneira totalmente diferente. Ao mesmo tempo, se a 10 realizadores diferentes fosse dado o mesmo tema, e se eles nunca se encontrassem, provavelmente resultariam 10 filmes completamente diferentes. São coisas muito difíceis de definir.

"(...) No caso do documentário há um assunto que acho importante discutir a este nível: o facto de hoje em dia, para mim, ele estar demasiado formatado a modelos televisivos. Como tem pouca divulgação comercial e no cinema, os canais televisivos são a sua possibilidade de divulgação. E esses canais impõem certas regras, que podem ter a ver com a duração do filme, com formatos, até mesmo com a escolha do próprio suporte, que condicionam a realização do filme. Mesmo os próprios assuntos: os canais televisivos interessam-se talvez muito mais por coisas da actualidade, ou com contornos mais sociológicos. Lembro-me por exemplo de ter assistido a certas sessões de pitchings onde era óbvio que alguns projectos eram barrados porque não eram interessantes no contexto actual, do ponto de vista das televisões que a este nível funcionam como centros decisórios.

"Eu percebo que realmente se calhar não é possível toda a gente estar a filmar, mas acho que deste modo também se limitam em excesso algumas coisas que aparentemente podem não ser importantes num determinado momento, mas que um dia poderão vir a ser. O próprio filme considerado sem “interesse” – porque não é pertinente, ou actual – pode ser bem mais interessante em termos cinematográficos, do que aquele que se achou importante produzir, mas que nada tem de cinema. Acho que no documentário isto às vezes é um pouco confuso. Há muitas coisas tomadas como documentários que mais se parecem com reportagens ou com os antigos jornais de actualidades, que não têm um cunho daquilo que, na minha opinião, deveria ser o documentário cinematográfico.

"Mas acho que isto não se passa só ao nível do documentário, acontece também na ficção: há produtos que se percebe que são de televisão. E são feitos até com imensa qualidade, e têm méritos, mas são coisas de consumo imediato. São entretenimento, e terão o seu valor por isso mesmo, mas também não são mais do que isso. Não entram na categoria da obra de arte."

Até logo!

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