quinta-feira, 26 de julho de 2018

107ª sessão: dia 27 de Julho (Sexta-Feira), às 21h30


E antes de irmos de férias, em Agosto, passamos pelos recintos de bowling, os subúrbios de Los Angeles, os submundos da pornografia, dos grupos de niilistas, de artistas e filantropas feministas de O Grande Lebowski, dos irmãos Coen, a nossa próxima sessão no estaleiro cultural da velha-a-branca. Praticamente ignorado durante a estreia, o filme teve direito a uma segunda vida quando foi reposto no New Beverly Cinema (agora de Quentin Tarantino), o que só prova a necessidade imperativa e imprescindível de circuitos e de salas dedicados às reposições. Vasco T. Menezes, crítico e co-tradutor de várias obras de David Foster Wallace ou Chuck Palahniuk, bem como grande admirador desta obra dos irmãos Coen, apresentar-nos-á  o filme em vídeo.

Quando a Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos seleccionou o filme dos irmãos para o National Film Registry, em 2014 (junto a Rio Bravo de Howard Hawks ou Ruggles of Red Gap de Leo McCarey), deixou escrito em comunicado para a imprensa que "foi dos visionários pouco convencionais, Joel & Ethan Coen (os cineastas por trás de Fargo e O Brother, Where Art Thou?), que veio este conto de 1998 sobre sequestros, identidades trocadas e bowling. Como fariam outra vez no Burn After Reading de 2008, os Coen exploram temas de alienação, desigualdade e estrutura de classes através de um grupo de personagens azaradas e insólitas subitamente arrastadas para as órbitas umas das outras. Jeff Bridges, num papel de fazer uma carreira, é o protagonista como “The Dude,” um mandrião de LA que partilha o último nome com um homem rico cuja esposa-troféu deve dinheiro a figuras suspeitas. Ao lado de Bridges estão John Goodman, Tara Reid, Julianne Moore, Philip Seymour Hoffman, Steve Buscemi e, numa participação especial agora lendária, John Turturro. Recheado de vinhetas—todas encenadas através do estilo visual absurdo e inovador característico dos Coen—que são engraçadas e perturbadoras, alternadamente, Lebowski foi só razoavelmente bem sucedido nas bilheteiras durante o seu lançamento inicial. No entanto, a televisão, a Internet, o vídeo e o DVD e um passa-a-palavra considerável fizeram do filme um clássico de culto altamente citado."

Quando Andy Green, da Rolling Stone, perguntou a Jeff Bridges sobre a importância da sua vida durante os anos sessenta para o seu papel, ele disse, "Baseei-me muito nisso. Os irmãos Coen disseram, “Ah, estamos a escrever uma coisa para ti.” E eu fiquei muito animado porque sou um grande fã de Blood Simple. Passaram-se anos, finalmente mostraram-se o que tinham escrito, e era o "Dude", estão a ver. Não conseguia perceber onde é que tinham arranjado essa personagem. Não era parecido com nada que tivesse interpretado antes. Mas parecia que tinham estado comigo em algumas festas nos anos sessenta ou algo parecido. Lembrou-me imenso de mim mesmo naqueles dias. Eu fumei a minha quota-parte de erva e tudo isso, e o cabelo comprido.

"Essa é uma das formas como preparo todos os meus papéis. Olho para mim próprio e penso, Que aspectos de mim mesmo é que vou usar para este gajo, e de que lados é que me quero livrar? E faço isso a um nível emocional, mas também a um nível físico. A minha aparência e o meu guarda-roupa são muito importantes. Eu meio que trabalho no exterior e no interior ao mesmo tempo. Eles meio que comunicam entre si. Portanto fomos ao meu armário para ver as minhas roupas, para meio que combinar com as do "Dude". E acabamos por encontrar todo o tipo de coisas. Aquelas sandálias de geleia, algumas T-shirts que tinha."

Já Vasco T. Menezes, aquando do lançamento do filme em DVD na série Y, com o Público, escreveu que "o filme nasceu da vontade que Joel e Ethan tinham de fazer uma versão moderna das histórias de Raymond Chandler (um dos mestres da literatura pulp e noir, de que os irmãos são entusiastas) e de dar à narrativa um aspecto literário. Além disso, através de um enredo que, à maneira dos romances de Chandler, se movesse pelas diferentes classes sociais e zonas da cidade dos anjos de Pasadena a Malibu, os Coen poderiam apresentar a sua visão da peculiar cultura de Los Angeles, tal como tinham feito no anterior Fargo em relação ao Minnesota. Mas, ao contrário do que acontecia aí, o olhar é o de dois outsiders. Ainda somos turistas em LA, apesar de lá termos vivido durante pequenos períodos de tempo, disseram os dois nova-iorquinos de adopção, que basearam muitas das personagens em amigos ou pessoas que conheceram nessas estadias. 

"O Grande Lebowski, com a sua narrativa sinuosa feita de confusões e que no fundo (ao estilo chandleresco) não tem importância nenhuma, é uma homenagem parodiante ao género policial. O modelo é o The Big Sleep de Chandler, para o qual remete o velhote milionário de cadeira de rodas, tal como a filha sofisticada, Maude (Julianne Moore), e a mulher ordinária, Bunny, variações das irmãs dessa obra. 

"Os Coen transformam um conjunto de trivialidades, enganos e desentendimentos em algo semelhante a um enredo, sob a lógica da coincidência. As sucessivas pistas falsas e digressões da narrativa têm como único propósito o desenrolar de uma série de acontecimentos absurdos e a apresentação de uma inolvidável galeria de excêntricos. São os típicos idiotas incompetentes que sobrestimam as suas capacidades e perseguem sonhos irrealizáveis (aqui, a obtenção do fictício milhão de dólares de resgate), uma constante no cinema da dupla ao lado dos raptos e de homens gordos e barulhentos, que também aqui marcam presença."

Até amanhã!

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