Ulzana's Raid, western fabuloso de Robert Aldrich com um muito atento e muito cauteloso Burt Lancaster, que interpreta um profissional desencantado e amargurado incumbido de seguir a pista do Índio Ulzana, é a nossa próxima sessão. Lançado numa altura em que o western dava os últimos suspiros como género, o filme olha de novo para as histórias de formação, expansão e consolidação da América como país tentando dar novas luzes e sentidos novos às complexas relações raciais entre índios e colonos.
A anteceder o filme, teremos uma apresentação em vídeo por Marlon Krüger, crítico brasileiro formado em Cinema pela UFSC em 2012. Trabalhou em curtas-metragens, organizou mostras e sessões pelo Cineclube Rogério Sganzerla e redigiu textos críticos para a revista Foco e para a revista Contracampo. Pesquisou o cinema de Maurice Pialat no Programa de pós-graduação em Literatura da UFSC.
Robert Aldrich, nos anos 70, era realizador veterano (o seu primeiro filme, Big Leaguer, é de 1953, depois de alguns anos a trabalhar como assistente de realização de Joseph Losey, Jean Renoir e os nossos conhecidos Robert Rossen e Charles Chaplin, entre outros) e conseguiu atravessar essa década com muito sucesso. Como Mulligan, serviu de elo de ligação e de passagem de testemunho entre a Velha e a Nova Hollywood.
Em 1955, em pleno fervor da descoberta de Aldrich pelos Cahiers du Cinéma escrevia-se no número 54 da revista (no Dictionnaire des Réalisateurs Américains Contemporains que vai da página 47 à 63) que era "a descoberta do ano. A sua entrada no cinema tem menos de "sucessão" do que de um autoritário "sai daí que estou a ir" da bola num jogo de bowling. Uma geração atira a outra fora com um vigor em que entram muita insolência, um bocado de bluff, muito talento e uma grande sinceridade. Depois de O Último Apache e The Big Knife, já não se podem ver Zinnemann ou Kazan como os cérebros de Hollywood. No universo de Aldrich respira-se o ar atómico: de Jean Cocteau, Aldrich tem o sentido muito vivo do realismo que surge em ricochete quando menos se espera, e de Orson Welles, a estética ensurdecedora e imperativa, com cada plano, imprevisível, a desafiar as regras, cada cena a maltratar o corte clássico. Se as personagens de Aldrich são estilizadas, o meio em que - de alguma maneira - elas respiram é inventado. As intrigas de Aldrich põem em causa o mundo inteiro e esse mundo pode morrer: Kiss Me Deadly, The Big Knife, ou voltar à vida: O Último Apache, Vera Cruz. Aldrich consegue ainda carregar às costas o velho mundo, pôr o novo no bolso e o lenço dele por baixo: World for Ransom. Para o grande Robert, a mise en scène é um jogo olímpico, a sua carreira faz lembrar uma maratona de carros de corrida e de corrida em patins ao mesmo tempo. É o realizador vivo mais vivo de todos, aquele em que se detecta de antemão o amor ao cinema e o prazer de o fazer."
A anteceder o filme, teremos uma apresentação em vídeo por Marlon Krüger, crítico brasileiro formado em Cinema pela UFSC em 2012. Trabalhou em curtas-metragens, organizou mostras e sessões pelo Cineclube Rogério Sganzerla e redigiu textos críticos para a revista Foco e para a revista Contracampo. Pesquisou o cinema de Maurice Pialat no Programa de pós-graduação em Literatura da UFSC.
Robert Aldrich, nos anos 70, era realizador veterano (o seu primeiro filme, Big Leaguer, é de 1953, depois de alguns anos a trabalhar como assistente de realização de Joseph Losey, Jean Renoir e os nossos conhecidos Robert Rossen e Charles Chaplin, entre outros) e conseguiu atravessar essa década com muito sucesso. Como Mulligan, serviu de elo de ligação e de passagem de testemunho entre a Velha e a Nova Hollywood.
Em 1955, em pleno fervor da descoberta de Aldrich pelos Cahiers du Cinéma escrevia-se no número 54 da revista (no Dictionnaire des Réalisateurs Américains Contemporains que vai da página 47 à 63) que era "a descoberta do ano. A sua entrada no cinema tem menos de "sucessão" do que de um autoritário "sai daí que estou a ir" da bola num jogo de bowling. Uma geração atira a outra fora com um vigor em que entram muita insolência, um bocado de bluff, muito talento e uma grande sinceridade. Depois de O Último Apache e The Big Knife, já não se podem ver Zinnemann ou Kazan como os cérebros de Hollywood. No universo de Aldrich respira-se o ar atómico: de Jean Cocteau, Aldrich tem o sentido muito vivo do realismo que surge em ricochete quando menos se espera, e de Orson Welles, a estética ensurdecedora e imperativa, com cada plano, imprevisível, a desafiar as regras, cada cena a maltratar o corte clássico. Se as personagens de Aldrich são estilizadas, o meio em que - de alguma maneira - elas respiram é inventado. As intrigas de Aldrich põem em causa o mundo inteiro e esse mundo pode morrer: Kiss Me Deadly, The Big Knife, ou voltar à vida: O Último Apache, Vera Cruz. Aldrich consegue ainda carregar às costas o velho mundo, pôr o novo no bolso e o lenço dele por baixo: World for Ransom. Para o grande Robert, a mise en scène é um jogo olímpico, a sua carreira faz lembrar uma maratona de carros de corrida e de corrida em patins ao mesmo tempo. É o realizador vivo mais vivo de todos, aquele em que se detecta de antemão o amor ao cinema e o prazer de o fazer."
Jacques Lourcelles, no seu Dictionnaire du Cinéma, escreveu (e desaconselhamos a leitura a quem ainda não tenha visto o filme): "Um dos raros westerns importantes dos anos 70. Retomando os temas e as personagens de O Último Apache (1954), Aldrich examina aqui, tentando compreendê-las, as crenças, as práticas de crueldade e a « loucura » índias. Estas representam tantos enigmas que os Brancos, no momento do seu combate, nunca tiveram sucesso em as esclarecer inteiramente. Mistério, medo e desencantamento caracterizam uma história extraordinariamente complexa e densa nas suas personagens e na sua mise en scène. Cenas de violência extrema ao lado de tentativas de explicação e de racionalização dos factos mostrados, de acordo com uma alternância já presente na obra-prima de Fuller, Run of the Arrow. Mas aqui ela é conduzida até um paroxismo do desassossego e do desequilíbrio. Esta história exprime a distância extrema que separava as duas raças e que só podia levar à eliminação de uma delas. Fatalismo pessimista e denúncia da incompreensão branca vão de mãos dadas na reflexão do cineasta. E é bem possível que Aldrich torne seu o julgamento amargo de McIntosh (admiravelmente interpretado por Lancaster), o herói deste filme sem heróis. A única coisa que os Índios conheceram do seu adversário foi o encarceramento, a fome e alguns tratados acompanhados por contra-ataques inábeis. A razão sem generosidade dos Brancos triunfa pela força do número (e não certamente pelas suas qualidades de combate) e acentua a violência, a loucura homicida de uma minoria racial coagida a ver a possibilidade de sobrevivência – durante um momento – apenas nessa mesma loucura. Fazendo esse juízo, McIntosh, porta-voz de Aldrich, enrola um último cigarro e deixa-se morrer fora do filme, algures."
Até Terça!
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