O último filme de Charles Chaplin não tem Chaplin em nenhum dos papéis principais, cabendo-lhe apenas o papel de um empregado que vai assistindo à comédia de enganos entre Marlon Brando, Sophia Loren, Tippi Hedren e o seu filho, Sydney Chaplin. Para nos falar dessa "constelação romântica" teremos Jesús Cortés, autor de Un blog comme les autres e um dos maiores admiradores deste filme fabuloso que encerrará o ciclo Chaplin.
Em The Parade's Gone By, Kevin Brownlow visita o plateau da Condessa, acompanhado por Gloria Swanson e concentrando-se na relação de trabalho de Chaplin com Marlon Brando, ouvindo palavras do primeiro ao segundo: «"Não—vais demorar mais do que isso, sabes." O velho profissional a aconselhar o jovem aprendiz. E demonstrou o gesto inteiro, indo todo para trás, engolindo o Alka-Seltzer, e arrotando no fim. Brando seguiu a maior parte das instruções de Chaplin, mas depois terminou com dois arrotos surpreendentemente realistas que mataram efectivamente a comédia.
«Nesta fase da produção, rumores sobre o comportamento temperamental de Brando circulavam amplamente. Depois, os relatórios de imprensa indicaram que estava tudo harmonioso. Mas por esta altura, era claro que se esperava que Brando imitasse Chaplin em vez de tentar desenvolver a sua própria interpretação. Para um actor dramático deste calibre, este tipo de direcção deve ter sido desconcertante.
«Para os espectadores, no entanto, esta direcção era milagrosa. Foi tão emocionante como ver um filme de Chaplin que ninguém sabia que existia; primeiro ele interpretava o papel de Brando, depois passava para outro lado e fazia o papel de Loren. Um era agressivamente masculino, o outro provocador e feminino, mas ambos permaneciam puro Chaplin. É uma grande perda para o cinema que Chaplin tenha recusado permitir que fosse feito um filme sobre a produção.»
Éric Rohmer, no livro de André Bazin dedicado a Charlie Chaplin, confessou que "ao contrário de Bazin, que explicava Chaplin por Charlot e pelo seu mito, eu gostaria de estudar Charlot à luz de Chaplin e da sua direcção, que aqui nos é oferecida – como outrora em A Woman of Paris – em estado puro, longe da sombra projectada pela presença mitificadora do herói. Pouco importa que os meus argumentos sejam de natureza oposta aos de Bazin, e às vezes até completamente antagónicos. Fico feliz de aproveitar a oportunidade para me reencontrar com ele: pois Chaplin era, no fundo, o seu preferido, e o filme que nos anos 1960 realmente me entusiasmou e inspirou sobre o cinema das ideias inovadoras foi precisamente A Condessa.
Em The Parade's Gone By, Kevin Brownlow visita o plateau da Condessa, acompanhado por Gloria Swanson e concentrando-se na relação de trabalho de Chaplin com Marlon Brando, ouvindo palavras do primeiro ao segundo: «"Não—vais demorar mais do que isso, sabes." O velho profissional a aconselhar o jovem aprendiz. E demonstrou o gesto inteiro, indo todo para trás, engolindo o Alka-Seltzer, e arrotando no fim. Brando seguiu a maior parte das instruções de Chaplin, mas depois terminou com dois arrotos surpreendentemente realistas que mataram efectivamente a comédia.
«Nesta fase da produção, rumores sobre o comportamento temperamental de Brando circulavam amplamente. Depois, os relatórios de imprensa indicaram que estava tudo harmonioso. Mas por esta altura, era claro que se esperava que Brando imitasse Chaplin em vez de tentar desenvolver a sua própria interpretação. Para um actor dramático deste calibre, este tipo de direcção deve ter sido desconcertante.
«Para os espectadores, no entanto, esta direcção era milagrosa. Foi tão emocionante como ver um filme de Chaplin que ninguém sabia que existia; primeiro ele interpretava o papel de Brando, depois passava para outro lado e fazia o papel de Loren. Um era agressivamente masculino, o outro provocador e feminino, mas ambos permaneciam puro Chaplin. É uma grande perda para o cinema que Chaplin tenha recusado permitir que fosse feito um filme sobre a produção.»
Éric Rohmer, no livro de André Bazin dedicado a Charlie Chaplin, confessou que "ao contrário de Bazin, que explicava Chaplin por Charlot e pelo seu mito, eu gostaria de estudar Charlot à luz de Chaplin e da sua direcção, que aqui nos é oferecida – como outrora em A Woman of Paris – em estado puro, longe da sombra projectada pela presença mitificadora do herói. Pouco importa que os meus argumentos sejam de natureza oposta aos de Bazin, e às vezes até completamente antagónicos. Fico feliz de aproveitar a oportunidade para me reencontrar com ele: pois Chaplin era, no fundo, o seu preferido, e o filme que nos anos 1960 realmente me entusiasmou e inspirou sobre o cinema das ideias inovadoras foi precisamente A Condessa.
"Dito isto, já disse tudo, porque os meus pensamentos são indizíveis. Em abono da verdade, nem sequer são pensamentos, mas sim intuições, pressentimentos. Intuição, por exemplo, de que se Charlot – ou Chaplin – não é todo o cinema, como sustentaram paladinos zelosos, todo o cinema, para quem sabe procurar, está em Charlot, em filigrana, e um cinema que, em 1972, não disse a sua última palavra. Mas falar desse filme, analisá-lo, desmontar o seu mecanismo, para quê? Ele não se explica, já que ele próprio é o princípio explicador. Pode-se dizer tudo por meio da Condessa, nada sobre ela. O melhor estudo a ser feito sobre o filme é retomar os filmes de Chaplin uns a seguir aos outros e descobrir como anunciam, cada um à sua maneira, esse ponto de chegada que ele é na série, último até ao presente, e provavelmente para sempre, desses pontos finais que são os Chaplins falados, incluindo Tempos Modernos, o qual, por sua vez, poderíamos explicar dessa forma, às avessas de Bazin.
"Aliás, como falar de um filme cujo principal mérito reside precisamente na dificuldade de se falar dele? Ora, em toda a história do cinema os filmes de Chaplin são aqueles que conseguiram ser os mais comentados. São também os mais fáceis de contar. Os seus gags fazem rir “no papel”, ao passo que os de Buster Keaton, digamos, não se conseguem reduzir em termos de discurso. No universo conceptual de Charlot, o objecto vale pela ideia que se prende a ele – a sua função normal ou desviada –, a sua forma e suas dimensões pouco importam. Pelo contrário, em Keaton elas são determinantes, onde o cómico pode nascer sem referência alguma à função, ao tamanho ou à forma do motivo apresentado."
"Aliás, como falar de um filme cujo principal mérito reside precisamente na dificuldade de se falar dele? Ora, em toda a história do cinema os filmes de Chaplin são aqueles que conseguiram ser os mais comentados. São também os mais fáceis de contar. Os seus gags fazem rir “no papel”, ao passo que os de Buster Keaton, digamos, não se conseguem reduzir em termos de discurso. No universo conceptual de Charlot, o objecto vale pela ideia que se prende a ele – a sua função normal ou desviada –, a sua forma e suas dimensões pouco importam. Pelo contrário, em Keaton elas são determinantes, onde o cómico pode nascer sem referência alguma à função, ao tamanho ou à forma do motivo apresentado."
Já Tippi Hedren, em 2016, para o Guardian, falou da sua experiência com Chaplin no rescaldo da rescisão de contrato muito complicada com Alfred Hitchcock, dizendo que "era mesmo difícil avançar. Eu ouvia de filmes que eram oferecidos, mas para chegar até mim eles tinham que passar por ele. Foi uma altura triste para mim. Ele tinha a mesma resposta para todos os produtores, realizadores, agentes e argumentistas que telefonavam e me queriam contratar: “Ela não está disponível.” Finalmente, dois anos depois, deixou-me ir. Duas semanas depois disso, recebi a chamada de Chaplin para trabalhar no novo filme dele, A Condessa de Hong Kong.
"Isto foi um novo começo, algo diferente. Eu pensei, não é incrível conseguir trabalhar com dois dos ícones mais famosos no cinema? Foi interessante conhecer Chaplin depois de Hitchcock, os estilos de direcção deles eram tão diferentes. O método de Chaplin era interpretar todos os nossos diferentes papéis, o que era brilhante de ver. Em vez de dirigir, ele saía para o plateau e dizia: “OK, façam isto,” e mostrava-nos como. Transformava-se na Sophia Loren. Transformava-se em mim e no Marlon. Foi muito invulgar e nunca o tinha visto a acontecer, antes. Conseguem imaginar o Marlon Brando a lidar com isso?"
Até Sexta-Feira!
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