terça-feira, 26 de novembro de 2019

154ª sessão: dia 28 de Novembro (Quinta-Feira), às 21h30


Continuando a nossa primeira parte deste ciclo, já na última projecção do mês, voltamos à história do cinema português vista por Manuel Mozos, desta feita com Cinema Português... ?, montagem de materiais intercalada com uma conversa com João Bénard da Costa, e Olhar o Cinema Português: 1896-2006, visão de conjunto constituída de material da série de televisão "Síntese Histórica do Cinema Português" (de que já vimos o episódio de Mozos, Tristes Anos: 1945-1960). É esta a nossa próxima sessão dupla no auditório da Casa do Professor.

Na sinopse da Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema de Olhar o Cinema Português: 1896-2006, lê-se que a "nova incursão de Manuel Mozos sobre a história do cinema português, Olhar o Cinema Português 1896-2006 assume uma perspectiva didáctica propondo um panorama de 110 anos de história, "uma síntese" que parte quase exclusivamente de material de arquivo proveniente da série de oito episódios "História do Cinema Português", produzida por Pedro Éfe em 1998, na qual Mozos realizou o episódio Os Tristes Anos focando os anos 1945-1960. Amplamente composto por imagens dos filmes portugueses que constituem essa história, o documentário de Mozos inclui também o discurso directo de alguns dos seus protagonistas. "Tenta-se relatá-la cronologicamente e, apesar de certas lacunas, de um modo acessível, conciso e didáctico"."

Na conversa entre Mozos e Miguel Cipriano que nos tem guiado por este ciclo, o realizador diz que a génese de Cinema Português... ? foi pensada no rescaldo de Lisboa no Cinema - Um Ponto de Vista e que "(...) um bocado devido a esse filme, e juntando a umas ideias que eu tinha de há uns anos atrás, eu propus à “Rosa Filmes” um outro projecto, que originalmente seriam quatro filmes sobre o cinema português. A minha ideia era cruzar oito áreas, duas a duas, para cada filme. E teria a ver com actores, realização, técnicos, exibição, distribuição, laboratório, crítica, ensaio... Eu não queria fazer uma coisa cronológica, mas sim cruzada, precisamente, em que de uns motivos passariam para os outros.

"Na altura o Instituto não tinha concursos para séries, mas como em 1996 se comemoravam os 100 anos do Cinema, foi criada uma comissão para a celebração dessa data, e nós apresentámos o projecto a essa comissão. Havia pelo menos mais dois projectos a concurso. O nosso foi preferido, só que entretanto a verba que a comissão teve não era tão avultada como eles estavam à espera, e o que eles sugeriram foi apresentar o projecto ao Instituto de Cinema, mas um a um. Nessas circunstâncias pensei que não valia a pena, e comecei a trabalhar no sentido de ser apenas um filme. Aí decidi ficar só com uma pessoa, e optei pelo Bénard da Costa, para tentar fazer uma coisa sobre o cinema português. Falei com o Sapinho e com o Luís, que foram sempre muito correctos comigo, e falei com o João Bénard da Costa, que aceitou."

Sobre o seu entrevistado, João Bénard da Costa, disse que "(...) não queria entrevistá-lo enquanto director da Cinemateca, mas sim como uma pessoa que conhecia bem o cinema português, então propus que ele escolhesse um sítio onde pudéssemos filmar e ficar lá durante um dia a falar. Ele propôs a casa dele e, portanto, a rodagem decorreu apenas durante esse dia. Começámos por volta das dez horas da manhã e estivemos a filmar em contínuo praticamente até às sete da tarde. A primeira parte filmámos no jardim da casa, a segunda parte durante o almoço que ele nos ofereceu, e a terceira parte numa sala, que acabámos por não utilizar. O que ficou combinado com a “Rosa Filmes”, e que vinha já do Lisboa no Cinema, era o trabalho ser feito sobretudo na montagem. Por um lado, o acesso aos filmes tinha que ser possível, por outro lado devia poder experimentar a construção do filme à vontade."

Ainda sobre Cinema Português, Luís Miguel Oliveira escreveu que "o filme de Manuel Mozos, reflectindo sobre a existência de algo que permita validar e dar um sentido à expressão "cinema português", coloca-se logo de início sob o signo da provocação. As primeiras palavras que ouvimos sobre o nosso cinema (num excerto do Acto da Primavera de Manoel de Oliveira) são "que frete!". Depois, entra a canção de Johnny Guitar, como se se estivesse de facto a sair do universo estrito do cinema português e, em face de semelhante "frete", a procurar outras paragens, eventualmente mais compensadoras. Percebemos, de seguida, que essa canção serve para preparar a entrada em "cena" de João Bénard da Costa, momento em que, assim incorporados os mais expandidos preconceitos contra o cinema português (as primeiras declarações de João Bénard da Costa são sobre eles, num "raccord" com a frase inicial), a reflexão pode, enfim, começar. Uma reflexão que nos conduz menos a uma abordagem liminarmente histórica do que ao estabelecimento de relações, por vezes subterrâneas, entre diversos filmes e diversas épocas do cinema português, tentando encontrar os padrões temáticos e formais que permitam retirar ao título do filme as reticências e o ponto de interrogação. Aliás, se se começa, como vimos, em "trompe l'oeil", a relação que o filme estabelece com o seu título (Cinema Português...? Diálogos com João Bénard da Costa) permite o prolongamento desse jogo. Porque, afinal, quem dialoga com João Bénard da Costa é menos Manuel Mozos do que o próprio cinema português, através das imagens que o cineasta articula com o discurso oral. A relação é mesmo de articulação, nunca de ilustração, e essas imagens são expostas segundo um dispositivo "godardiano" (este é verdadeiramente um filme pós-Histoire(s) du Cinéma), reflector de uma crença na "transparência" das imagens: ou seja, a ideia de que o sentido de uma imagem "perfura" a sua superfície, e que esse fundo se manifesta, em plena evidência, quando a imagem é posta em diálogo com outras imagens. Com este filme, Manuel Mozos dá o primeiro passo para uma outra história do cinema português."

Até Quinta-Feira!

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