por Alexandra Barros
A Mulher que Eu Abandonei abre com uma máscara Noh, mas passa-se num Japão
ocidentalizado, no final da década de 60. É uma história de sufocos sentimentais, centrada em
Yoshioka, um estudante universitário. Tem como pano de fundo as convulsões sociais da altura,
incluindo movimentos estudantis de protesto e revoltas no mundo laboral.
Embora Yoshioka tenha uma relação intensa com Mitsu - uma rapariga carinhosa e devotada -
abandona-a devido às suas ambições de ascensão social. Mitsu é substituída por Mariko, a
sobrinha do presidente da fábrica onde Yoshioka trabalha. Apesar de Mariko estar apaixonada por
Yoshioka, ele não consegue viver com ela um amour fou como o que viveu com Mitsu. Yoshioka e
Mariko têm um namoro “formal”, com forte presença e compromissos com o clã familiar de Mariko.
Ela desempenha o seu papel de acordo com as convenções sociais, menorizando a paixão. A
máscara Noh, que veremos por diversas vezes ao longo do filme, reforça essa ideia de
representação que é a vida em sociedade. “Todos têm as suas próprias circunstâncias.” diz Mariko,
quando Yoshioka se mostra desiludido por ela privilegiar os desejos da família relativamente aos
desejos dele.
Sem o amor devotado e incondicional de Mitsu, Yoshioka murcha. Embora aparentemente tenha
ficado indiferente ao fim da relação, ficou, de facto, desamparado. Apesar dos esforços de Mariko
para reforçar a união sentimental entre os dois, a solidão interior de Yoshioka contamina o
casamento. O desapego de Yoshioka condena Mariko, por sua vez, à solidão.
Quando Yoshioka reencontra Mitsu, torna-se impossível manterem os sentimentos enclausurados e
caem numa teia preparada para capturar Yoshioka. Mitsu enfrenta a “aranha” para salvá-lo e este
acaba por perdê-la para sempre. Confrontada com a devastação de Yoshioka, Mariko compreende
finalmente porque é que nunca se sentiu amada e, desesperada, quer perceber “Quem é Mitsu?”.
“Mitsu sou eu! E tu também és Mitsu!”, é a resposta de Yoshioka, que, por fim, vê com clareza o
triângulo de sofrimento que criou em nome do “sucesso”. Caídas as máscaras, a paleta cromática
do filme passa do preto e branco para a cor.
Sem comentários:
Enviar um comentário