sexta-feira, 14 de junho de 2024

12 Angry Men (1957) de Sidney Lumet



por Nuno Dias

Sidney Lumet começou a sua carreira em criança, como ator em peças de teatro e da Broadway em Nova Iorque, cidade onde cresceu. Anos mais tarde, estreou-se no mundo do cinema pouco antes de ter de prestar serviço militar durante a 2a Guerra Mundial. Após a guerra, regressou a Nova Iorque, onde trabalhou como professor de artes cénicas e dramáticas e, mais tarde, realizou alguns episódios de televisão para a CBS. Doze Homens em Fúria foi a sua primeira longa-metragem, que realizou em 1957, protagonizada por Henry Fonda. O filme, adaptado de uma peça televisiva de 1954, tornou-se um clássico do designado “courtroom drama,” ou “drama de tribunal,” e lançou Lumet numa longa e bem-sucedida carreira de cinema. Os seus filmes, muitos deles adaptações de peças de teatro, frequentemente tiveram pouco êxito em bilheteira, mas foram quase sempre bem recebidos pela crítica. Algumas das principais obras que se destacaram incluem Missão Suicida, O Agiota, A Colina Maldita, Serpico, Escândalo na TV, Um Dia de Cão, O Veredicto e Um Crime no Expresso do Oriente. Contudo, Doze Homens em Fúria permanece um dos títulos mais ilustres da sua carreira, e aborda vários temas que se manifestam em todo o seu percurso fílmico. 

Ao inspecionar a obra de Lumet, é notório o seu interesse não só por instituições policiais e jurídicas, mas também por sistemas de poder, e como esse poder é recorrentemente abusado e corrompido por aqueles que o detêm. Contudo, a perspetiva dos seus filmes é mais profunda do que uma mera exposição da injustiça social ou política vivida nos Estados Unidos, ou o desequilíbrio na dinâmica entre classes e governo. Nos seus filmes, Lumet explora as nuances que existem em torno dessas dinâmicas, como se manifestam no quotidiano e como a corrupção presente em muitas instituições estabelecidas na sociedade norte-americana é justificada, ou mesmo aceitada pelos próprios cidadãos, para a preservação de um falso equilíbrio social. No caso de Doze Homens em Fúria, cuja narrativa decorre em torno da deliberação de doze jurados sobre um caso de homicídio que culminará em pena de morte, a acusação satírica não poderia ser mais evidente. Numa sala de doze jurados, onze dos quais estão absolutamente convictos de que o arguido, uma criança de etnia minoritária, é culpado sem ponderarem o caso detalhadamente, apenas um manifesta a sua preocupação em questionar a veracidade dos factos. No final da deliberação, a certeza inquestionável da culpabilidade do réu é seriamente contestada e retrospetivamente atribuída a negligência, preconceito e até mesmo mágoa pessoal. Assim, fora o erro emocional e individual do sistema jurídico que teria falhado o jovem arguido e perpetuado uma narrativa preconceituosa sobre uma determinada classe e fração populacional. Por conseguinte, é sugerida uma reflexão de como a justiça teria permitido tal fracasso ético não fosse pela honestidade intelectual de um único homem que denotou um tipo de corrupção que não é intencional, mas que estava embrenhada no vocabulário coletivo da sociedade norte-americana da época. O filme, deste modo, é um caso de estudo sobre como os preconceitos, a parcialidade e os interesses individuais, mesmo inconscientes, contribuem para a corrupção de uma instituição de poder. 

Lumet é conhecido também por suscitar atuações intensas e climáticas nos atores dos seus filmes, e Doze Homens em Fúria não é exceção. As suas histórias tendem a desenvolver-se em torno de um único incidente central, cujas ramificações narrativas nunca se afastam muito do tronco principal. Tal como Sonny e Sal em Um Dia de Cão, forçados a permanecer no banco que tentaram assaltar rapidamente, ou Poirot e restantes passageiros em Um Crime no Expresso do Oriente, presos no comboio com um assassino entre eles, também os jurados em Doze Homens em Fúria se vêem confinados a uma pequena sala de tribunal até chegarem a uma decisão unânime sobre o caso. Uma sensação de claustrofobia instala- se no enredo, ainda mais agravada pelas condições físicas do espaço, o crescente calor, a impaciência, e a animosidade entre os membros do júri. Durante todo o filme, o espectador está confinado à mesma sala que os personagens, obrigado a desvendar o caso em conjunto com eles. Esta é uma caraterística muito proeminente do filme, e cria uma tensão natural que aumenta gradualmente com o tempo, até culminar num êxtase emocional com a concordância entre os jurados. Ao total, o enredo parece decorrer numa única cena de longa duração, que nunca perde o seu passo graças à excelente interpretação dos atores, à escrita cativante e à realização expressiva de Lumet, diversa e dinâmica em escalas e movimentos de planos.



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