segunda-feira, 21 de maio de 2018

96ª sessão: dia 22 de Maio (Terça-Feira), às 21h30


Quase a fechar o mês de Maio e o ciclo de cinema francês, veremos o último filme de Agnès Varda, cineasta associada à Rive Gauche (junto ao marido, Jacques Demy, Alain Resnais e Chris Marker) e autora daquele que é considerado por alguns como o primeiro filme da Nouvelle Vague, La pointe courte. Visages Villages é então a nossa próxima sessão, nos cinemas do Braga Shopping.

Transcrevemos e traduzimos o que Varda e JR, co-realizador do filme, responderam à Slant Magazine quando foram questionados sobre se a arte resgatava a memória: "Agnès Varda: Há muitos documentários a serem feitos pelo mundo inteiro. Isto é muito importante. É o que faz os arquivos, sabe? Agora, a arte faz algo diferente. Eu fiz um documentário sobre os respigadores, mas houve um artista que começou a respigar coisas e fazia arte com isto, portanto estava a respigar limpadores de pára-brisas, e começou a coleccionar isso e fez arte. Portanto, todos os tipos de respiga são importantes e fazemos o nosso trabalho com coisas que respigamos ou algo que encontramos e que as pessoas esqueceram ou sentimos que estávamos certos em encontrar estas pessoas. Mas talvez haja outro documentário sobre cabras, só que na altura achámos que “fomos nós que descobrimos isto, temos de o partilhar!”

"JR: A arte permite-nos partilhar alguma coisa. É como quando se é um repórter, se vai tirar uma foto e nunca mais se volta. No nosso caso, vamos lá, fazemos alguma coisa com as pessoas que documentamos. Muda a dinâmica toda da coisa porque partilhámos todos algo que construímos juntos. As pessoas dizem se querem e como querem ser retratadas, até ajudam a colar a foto. Portanto esse círculo todo está só a ser documentado, mas todos partilhamos algo juntos e a imagem na fábrica das pessoas a darem todas as mãos assim, isso foi feito para elas, sabem, portanto é mesmo algo de que se vão lembrar e ligar de volta a algumas pessoas na fábrica. Mas mais do que nós, documentamos apenas isso, mas para eles isso teve um verdadeiro impacto na fábrica porque muitas pessoas não falam umas com as outras. Há diferentes grupos, há diferentes lados políticos lá dentro, portanto isso é o que a arte consegue fazer um bocado mais do que documentários, talvez, mas quando tudo se combina, é maravilhoso.

"Varda: E tentámos mostrar o filme a toda a gente. As pessoas da fábrica foram convidadas a ver o filme perto da fábrica. Havia aqui um cinema, e em Le Havre vieram os trabalhadores das docas e nós fomos ter com eles. Fizemos uma festa com eles. A senhora no norte, teve que ser expulsa da casa dela, mas tem boas memórias do filme. Ela vai às projecções e é a estrela das projecções sempre que vai. A vida continua aí antes do filme e depois do filme—a vida verdadeira. É apenas algo no meio."

Inês Lourenço, que mantém os programas A Grande Ilusão e Afinidades Electivas, escreveu no Diário de Notícias que "Agnès Varda é de uma generosidade ilimitada. Já tínhamos provas suficientes disso - inclusivamente no autorretrato documental As Praias de Agnès (2008), em que manifesta o gosto de filmar sobretudo os outros - e voltamos a reconhecer-lhe o gesto humanista em Olhares Lugares

"O título preserva o espírito do original (Visages Villages, "rostos aldeias") e reflete a essência do seu cinema: a curiosidade pelo outro. Juntando-se aqui ao fotógrafo e muralista JR, que coassina a realização, Varda segue pela França mais remota à procura dos heróis do dia-a-dia, para colar nas paredes os seus retratos em grande escala, como forma de homenagem pública. 

"Esta é a arte que mais interessa à cineasta (veja-se Mur Murs, de 1981), uma mulher que no convívio e amizade partilha sempre algo da sua mágica coleção de memórias. Que filme genuíno e adorável."

Já Carlos Melo Ferreira, no seu blog,  adiantou que "muito ao jeito dela, que é uma lenda do cinema francês desde a "nouvelle vague" e desde aí se habituou e nos habituou a não fazer filmes para a bilheteira, este é um documentário que, mostrando o presente, evoca o passado dela e do cinema a partir da fotografia a que ela se dedicou e JR se dedica. 

"A partir da ideia da amplificação de fotografias para a fachada de edifícios, ambos visitam agricultores e operários do noroeste da França em pequenos trechos muito curiosos, enquanto dialogam e se picam um ao outro. Especialmente interessantes a visita à avó dele, centenária, a visita ao porto do Havre e às mulheres dos estivadores, e a visita ao pequeno cemitério onde está sepultado Henri Cartier-Bresson. 

"Mas a evocação que ela faz do cinema, em especial do seu tempo, tem o maior interesse como memória de uma época crucial da história do cinema de que ela é uma das poucas protagonistas e testemunhas vivas. Desse ponto de vista são especialmente interessantes as recordações do tempo em que, nos anos 60, ela e o Jacques Demy eram convidados do Jean-Luc Godard e da Anna Karina."

Até amanhã!

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